Cruzei-me hoje com este guarda-chuva, a secar. Não sei a quem pertence mas não pude deixar de o fotografar e, mais ainda, deixar de me imaginar sob o seu agasalho. A cabeça protegida dos chuviscos por este céu com estrelas e planetas por onde a imaginação, coartada pelo mau tempo, o céu cinzento (e real) e, certamente, um ou outro ameaço de coriscos, logo se poria a em jeito de viagem espacial, com um céu mais profundo, numa galáxia imaginada, quiçá prestes ao encontro de terceiro (ou ainda superior, se existir) grau. Bem haja o (a) seu(ua) feliz possuidor(a) que o deixou assim à minha disposição para imaginar.
Olha que original, mais um blog!
quinta-feira, 11 de janeiro de 2018
quarta-feira, 10 de janeiro de 2018
Poema de época
II
Chove.
Nem posso acreditar
como chove a minha cidade,
chove em mim
e chove sobre todos...
nem posso acreditar
o quanto chove esta cidade...
Se ao menos chovesse anjos,
ou estrelas,
ou almas...
Mas nada.
Nada mais que a fria chuva
que me molha
e que molha a minha cidade
em que chove, chove, chove.
Nem posso acreditar
o quanto a minha cidade chove. [...]
Chove.
Nem posso acreditar
como chove a minha cidade,
chove em mim
e chove sobre todos...
nem posso acreditar
o quanto chove esta cidade...
Se ao menos chovesse anjos,
ou estrelas,
ou almas...
Mas nada.
Nada mais que a fria chuva
que me molha
e que molha a minha cidade
em que chove, chove, chove.
Nem posso acreditar
o quanto a minha cidade chove. [...]
in "Sombras de Noite"
terça-feira, 9 de janeiro de 2018
Poema a uma cápsula anti-pirética
Nas minhas mãos ardendo
o teu corpo inteiro,
lânguido
límpido,
lúcido,
gelatinoso.
Tomo-te na língua,
a oferecer-te esta humidade que te embala,
até te deixares tragar pelo mais fundo de mim.
Agora que te abraço nas entranhas
hás-de fazer fugir-me a febre que me assalta –
esta aguda pirexia que
tão sofregamente te deseja.
o teu corpo inteiro,
lânguido
límpido,
lúcido,
gelatinoso.
Tomo-te na língua,
a oferecer-te esta humidade que te embala,
até te deixares tragar pelo mais fundo de mim.
Agora que te abraço nas entranhas
hás-de fazer fugir-me a febre que me assalta –
esta aguda pirexia que
tão sofregamente te deseja.
segunda-feira, 8 de janeiro de 2018
Desarvorar
Há um ano atrás, passou-se o primeiro Natal do meu filho. Por esta altura, escrevi este texto que partilhei no Facebook e hoje dei com ele. Ainda não desfiz a árvore deste ano. Aproveito o texto que me pareceu doce.
O meu filho sentiu a falta da árvore de natal. Estranhou a
sua ausência. Um belo dia adormece e, pela manhã, a árvore havia desaparecido.
Para onde teria migrado o pinheiro de brincar com luzes piscativas para onde
todos os dias apontava e onde ia tocar nas bolas e nas fitas,
experimentando-as? Não a vira nascer,
também um belo dia, ao despertar de uma das suas sestas acordou para a sua
presença, já muito instalada, na sala. Apôs-lhe a estrela no topo, devidamente
ajudado e içado ao metro e oitenta de pinheiro artificial. Não percebeu bem o
que era nem que significado teria e por que o fotografaram nesses preparos ou
por que se interessaram por isso, mas depois tornou-se atracção diária, gostava
de apontar para ela e de ser erguido até altos ramos onde descansavam enfeites
que o deixávamos tocar.
Não sei o que pensará sobre esta ausência, mas sei que a
estranhou. A vida, feita de ausências, grandes e pequenas, lhas há-de ensinar -
que remédio. Há-de apontar outros lugares vazios. Que sejam longe...e tão
importantes como uma árvore de natal de plástico.
domingo, 7 de janeiro de 2018
"Uma janela que não abre"
Um ano novo é todo um novo mundo,
como uma vida nova ou uma folha nova, toda em branco, para estragar. Momento dos planos para as grandes mudanças
(que em geral não sobrevivem nem um mês, tudo se diluindo por alturas do Carnaval),
arrumações e limpezas seja de papeis ou de teias aranha mentais.
A mim dá-me para a limpeza de
agendas, nomeadamente as telefónicas, mesmo estas mais actuais, devidamente
informatizadas, guardadas algures numa imaginária nuvem, caindo direitinha nos
secretos trilhos que levam aos nossos telemóveis, que por serem quase seres
pensantes de tão inteligentes já se chamam “smartphones” (só isto daria toda
uma crónica, a isso voltarei se me faltar o assunto).
Mas voltando ao tema… olho a
lista dos meus contactos e conforme a vou correndo assalta-me múltiplas vezes o
pensamento – será que é ainda este o número de Fulano ou Beltrano? – por haver
nela tanta gente com quem não falo há anos. Ocasionalmente apetece-me fazer uma
razia, limpando nomes de gente com quem nunca falo, que nunca me liga e a quem
não me lembro de ter grandes ganas de ligar. Por vezes faço-o, e só poucas
vezes me arrependi disso, outras acabo por manter o nome na lista, ainda que
sem saber se o número se mantém, é assim como uma memória de que aquela
alminha, nalguma altura da sua vida, se cruzou comigo, que nalgum tempo tive a necessidade
de lhe ligar, de comunicar, ou vice versa, ou que pelo menos me passou na ideia
essa necessidade.
Há, é claro, a limpeza dos que
morrem, a nostalgia da sua ausência para sempre – “saudade, querer a luz de uma
janela que não abre” – Abrunhosa dixit
– e é aqui mesmo que mais me delongo,
dedo apontado ao “delete”, antes do golpe final. Para quê manter um número que
é a janela que não abre nem abrirá nunca mais e porque custa tanto apagá-lo
como se ao apagar um nome enterrássemos mais fundo quem já não está? Lembro um
amigo a quem, logo após a sua prematura e auto-inflingida morte, eu e uma outra
amiga experimentamos ligar para ouvir a sua voz no gravador de mensagens – fi-lo
uma ou duas vezes e depois apaguei o número. É uma estranha experiência de
desacordo connosco mesmo, ou com o mundo como ele é, que sei eu? À época
lembro-me de o comentar com essa amiga, ambas achamos que era algo perverso
dentro de um quadro de ternura póstuma – devíamos ter ligado antes e mais vezes.
E a isto torno uma e outra e outra vez, sobretudo neste correr de agenda anual.
Quantas vezes ligamos tarde demais? Quantas vezes adiamos o inadiável, o amor
que se não pode adiar como disse, e tão bem, Ramos Rosa?
E de novo aos poemas me devolvo:
“A noite passada enviei um SMS a
meu Pai
Mas ele não respondeu. Já kontava kom issu. O
corpo dele baixou faz
outro mês amanhã
nenhum de nós destinou o Sony
Ericsson
dele ao rectângulo do caixão. […]”
(João Luís Barreto Guimarães)
sábado, 6 de janeiro de 2018
sexta-feira, 5 de janeiro de 2018
Poeminhas
Antes do abismo
Despedimo-nos
como uma rua de sombras,
rodando o corpo no chão,
perdendo o avesso da pele
em ilusões de infinitos,
perfumes de memória
trocados pelos dedos.
Segura-me em ti antes
que eu te morra,
ampara-me nos braços
contra a atracção do abismo.
como uma rua de sombras,
rodando o corpo no chão,
perdendo o avesso da pele
em ilusões de infinitos,
perfumes de memória
trocados pelos dedos.
Segura-me em ti antes
que eu te morra,
ampara-me nos braços
contra a atracção do abismo.
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